ENTÃO É NATAL
As
luzes estão acesas. Não sei se em baixo ou em cima do velador. Talvez alguém as
tenha colocado hasteada com toda pompa em algum candeeiro. Existem alguns que
são mais ousados. Chegam até ostentar uma espécie de candelabro, procurando dar
mais ênfase ao estereótipo de sua luminosidade. São as luzes do natal.
Há,
porém duas lágrimas gotejando em um olhar. Já chegaram à metade divisória do
rosto construindo em sua face uma espécie de estrada salpicada por declives que
se acentuam em cada esquina que projeta sua emoção. São lágrimas de ontem,
lágrimas de hoje e provavelmente se encontrarão com as lágrimas de amanhã.
Percebo
que o vento sopra forte. Quer enxugar aquelas lágrimas. Mas acaba apenas empurrando-as
para outro lugar. Há alguém querendo falar, mas uma fenda foi colocada em seus
lábios. Então somente o sabor amargo e salpicado das lágrimas passa a ser seu
instrumento de comunicação. Há se pudesse desabafar!
Do
outro lado da esquina, muitas luzes indicam a disputa pelo primeiro lugar.
Gavetas se abrem. Telefones tocam. Cédulas e cartões magnéticos ocupam a cada
momento novos espaços. Brilhos... Muitos brilhos... Quase todos feitos de pó e
cinza. Cinza de cadáveres rebuscados que apenas ali e naquele momento tiveram
algum tipo de valor. Valor subestimado é claro. Coitados.
De
repente mais duas lágrimas. Um novo tipo de fumaça esta a contaminar o
ambiente. Tem o formato arrogante de gorduras, doces e licor. Muitos são os que
exalavam tal fumaça. Parecem satisfeitos. Só muito tempo depois é que irão
entender que tudo não passa de fumaça.
De
repente, seus olhos percebem um outro tipo de luz. É como o esplendor de uma
estrela. Parece ser de muito longe, mas ao mesmo tempo tão perto. Então suas
lágrimas dão tom a um novo sentimento. É uma luz verdadeira. É algo tipo uma
estrela da manhã que estava cada vez mais ali. Parecia querer lhe dizer algo.
Até que finalmente disse.
De
repente um reflexo de luz. Ataduras arrancadas. Lábios livres. Ouvidos bem
abertos. Agora ele estava perto de alguém que podia ir além das lágrimas.
Poderia; pensar, sorrir, falar, sentir, amar. Parecia muito bom.
Finalmente
uma voz:
-Sabe!
Até agora você viu, muita sombra, poeira e fumaça. O brilho é falso. As cores
não são verdadeiras. Os motivos são mascarados. Eles trocaram o que era real
pela fantasia. Foram longe de mais criando formulas que produzissem alguma
espécie de analgésico psicológico para suas almas. Mas o efeito e passageiro.
Apenas anestesia, mas não cura.
É
por isso é que você não tem espaço junto deles. É por isso que você está com
fome. É por isso que você está na rua. Não tem uma casa para se abrigar. É por
isso que eles te consideram lixo. Consideram-te a escória da sociedade. Por
isso que apenas te dão esmolas. Fazem isto só para tentar resolver o vazio que
existe dentro deles mesmo.
Mas
fica tranquilo. Não foi somente você que eles rejeitaram. Eu também fui
rejeitado faz muito tempo. Eles me trocaram, por um tal de Papai Noel. Sabe por
quê? É que este não fala. Não diz nada. Não tem sentimento. Não conhece a
pobreza. Nunca teve entre os pobres. Vive somente em lojas e presépios, e no
final acaba lhes dando muito lucro. É apenas mais um objeto.
Mas
não chore. Eu não estou lá. Estou aqui com você. Permita-me apresentar. Meu
nome é Jesus Cristo de Nazaré.
Obs:
Hélio Machado é lincenciado em História e escritor com formação em teologia.
(Autor do livro “Graça o estereótipo de Cristo)